“Brandos Costumes”

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Às vezes ponho-me a pensar de mim para mim e na maior parte das vezes não penso nada de especial.

Faço teorias que muitas vezes esqueço, certas ou erróneas. A pressão das pequenas grandes coisas do dia-a-dia leva-me a isso. A esquecer um pensamento que poderia dar um fruto, uma crónica talvez muito melhor que esta que neste momento escrevo. Hoje estava sentada a assistir a debates de opinião pública na t.v., debates esses que no fundo são sempre os mesmos embora se lhes mudem a temática. Falava-se da economia portuguesa, dos cortes para atingir as percentagens do défice (não perguntem pois de economista tenho mesmo muito pouco) e da visita do Santo Padre, questionada pelos custos que teve e ainda está a ter. E é nesta altura que me veio à cabeça uma dessas teorias, que passo a descrever.

Estamos a pagar o preço da modernidade e da globalização. Numa Europa sem fronteiras quem não tem cão, não caça (o gato já não serve), o que coloca em causa a nossa cultura “desenrasca” , tão portuguesa: “o logo se vê” que foi substituindo aos poucos o “Deus quiser” sem que muitos tenham dado conta, e entretanto, quem diz isso, na verdade, não quer é ver nada e se poder, até tapa os olhinhos.

Mas não nos damos conta de muita coisa, nós os portugueses. Não nos conta do que se passa à nossa volta: alienamo-nos – a isso penso que se tem chamado de “brandos costumes”. Parece-me uma óptima desculpa para ficar quieto a ver passar o navio. Não nos damos conta, nem percebemos as velhas políticas, mas também não queremos perceber as novas. Damos ar de entendidos e queixamo-nos muito: bom português arranja sempre forma de se queixar. Pode queixar-se do tempo, do Governo, do salário, mas na verdade, quando se queixa de algo que está ao seu alcance, encolhe os ombros e “deixa lá…”

E hoje coloquei-me a pensar, será que na impossibilidade de caçar com gato (dadas as normas europeias em que cada coisa serve o seu destino e é proibido por lei desenrascar, por ser simplesmente ilegal, imoral ou perigoso para a saúde) estamos apenas preguiçosos? E serão esses os nossos famosos “brandos costumes”? Preguiça? Alienação? Mas sabemos telefonar para a t.v. A dar opiniões e a fazer queixas, aliás, vamos mais facilmente à t.v., do que ao Tribunal. É realmente mais célere, o sistema jurídico padece dos mesmos costumes. Não sou sebastianista, mas e as Descobertas? Continuamos a fazê-las, navegando pelos densos mares da internet, sempre, sempre sem sair do sofá. E parece-me que qualquer dia os “brandos costumes” serão um eufemismo para “moles hábitos”, mas isso é outra coisa.

A seguir a esta crónica vou ver vídeos pelo YouTube e substituir este canal noticioso por um canal de séries criminais norte-americano. E perderei estes pensamentos estranhos de vez. Quando sair do sofá, já nem me lembrarei do que estava a pensar.

Selma Nunes
Bica Escaldada Seg. a Sex.8h-12h
Chá de Menta Domingos 16h-18h
92.2FM |      www.atlanticofm.com

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