Massacre da Torre Bela: um episódio perturbador que veio justificar a revisão da Lei da Caça

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Agora que estamos todos cientes das insuficiências da Lei da Caça e da fiscalização desta atividade, urge corrigir a situação para travar novos crimes contra a Natureza.

As recentes notícias sobre o abate massivo de veados, gamos e javalis na Herdade da Torre Bela, na Azambuja, chocaram o país e acenderam perante a sociedade um debate há muito desejado pelas associações de defesa do ambiente. Apesar do Ministério do Ambiente ter igualmente criticado o massacre de 540 animais por apenas 16 caçadores, e pedido a sua responsabilização e penalização, é agora tão importante fazê-lo quanto tirar as devidas lições e firmá-las numa melhorada Lei da Caça.

A Lei da Caça e sua regulamentação contém insuficiências graves. Embora o episódio da Torre Bela possa configurar violação dos princípios gerais da Lei da Caça – e de outra legislação ambiental –, infelizmente a lei não explicita sequer quantos animais podem ser mortos por cada caçador numa montaria. Outros problemas graves da legislação incluem a permissão de caçar espécies ameaçadas, como a rola, e a utilização de munições de chumbo, metal altamente tóxico para o Homem e outros animais e que é assim disseminado pelo ambiente. Estes e outros problemas precisam de ser corrigidos na lei e as penalizações previstas têm de ser suficientemente pesadas para funcionarem como dissuasores.

O que aconteceu na Azambuja ilustra também um grave problema já há muito conhecido – a incapacidade de fazer respeitar a lei por falta de recursos humanos e materiais para o seu acompanhamento e fiscalização. Tanto o Instituto para a Conservação da Natureza e Florestas (ICNFMinistério do Ambiente) como o Serviço de Proteção da Natureza e Ambiente (SEPNA-GNR) têm recursos ridiculamente pequenos para a tarefa a seu cargo. É urgente capacitar estas instituições. Se a montaria na Torre Bela tivesse sido acompanhada, como deveria ter acontecido independentemente de isso ser ou não obrigatório por lei, o incidente não teria ocorrido. E com uma fiscalização eficaz haveria, por exemplo, muito menos casos de envenenamentos e abate intencional de espécies protegidas.

Independentemente do debate ético sobre a caça, é um facto que esta atividade pode ter um impacto positivo na conservação dos ecossistemas e das espécies. Um bom exemplo disso é a conservação do lince-ibérico em Portugal. Mas para que os bons exemplos, e não os maus, prevaleçam, é fundamental resolver os problemas elencados. A sua solução é do maior interesse tanto para a conservação da Natureza, como para a atividade cinegética. Aliás, o episódio foi igualmente condenado por associações de caçadores, que se distanciaram do sucedido. Apesar dos avanços que têm sido alcançados nas últimas décadas, é necessário reconhecer que existem ainda graves problemas no comportamento e formação de muitos caçadores e agentes da indústria cinegética. Embora neste caso os caçadores não fossem portugueses, mas sim espanhóis, é impossível empurrar toda a culpa para o outro lado da fronteira quando continuam a ser cometidos graves crimes contra a Natureza no nosso território.

Assim, apelamos ao Senhor Ministro do Ambiente para que concretize rapidamente não só a sua decisão de rever a Lei da Caça, mas também de solucionar todos os problemas paralelos, como a quase inexistência de fiscalização, uma vez que apenas boas leis não bastam para acabar com os atentados ao património natural de todos nós. É preciso vontade e capacidade dos organismos públicos relevantes para a sua aplicação.

Este comunicado é subscrito pela Associação Natureza Portugal em associação com WWF (ANP/WWF), pela Liga para a Protecção da Natureza (LPN), pela Quercus – Associação Nacional de Conservação da Natureza e pela Sociedade Portuguesa para o Estudo das Aves (SPEA).

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