O Pacto Ecológico Europeu preconiza que 30% dos solos e mares europeus sejam efetivamente áreas protegidas. E o conselho dos 26 estados membros, no âmbito da reforma da política agrícola e das estratégias nacionais, quer apenas que se proteja 22%!
Esta posição do Conselho Europeu não é uma postura ambiciosa, mas, pior ainda, não é a postura que a situação mundial exige face aos perigos que ameaçam a humanidade e o planeta!
É esta postura que conduz a que o parque natural da Ria Formosa até ao sapal, sendo área protegida, integrado na rede natura 2000, sofra os impactos negativos do regadio, do glifosato e do plástico agrícola de forma contínua e cumulativa.
Quer o Conselho Europeu, que 44% dos fundos europeus sejam aplicados neste declínio da casa comum, o planeta!
Por todo o mundo, modelos de agricultura intensiva com recurso a um elevado uso de agrotóxicos têm levado à sobre-exploração, contaminação e erosão dos solos, poluição das águas e conduzindo a uma perda galopante e sem precedentes da biodiversidade.
Tendo em conta :
1. Os impactos na saúde pública
Alguns fitofármacos, como o glifosato, usados na agricultura intensiva, são potencialmente cancerígenos. Por outro lado, há a questão da relação entre as novas pandemias e a agricultura intensiva .
Os interesses da indústria agroquímica, de fertilizantes e insecticidas de síntese, não pode prevalecer sobre os interesses de toda a população, não pode continuar a envenenar quem trabalha na agricultura, ou quem vive junto das plantações.
2. A situação climática e hidrológica
Abraçar uma abordagem inovadora ao ser elaborado o plano estratégico nacional resultante da convicção que a agroecologia será a chave para produzir uma imprescindível transição para sistemas alimentares sustentáveis.
A biodiversidade que sustenta os nossos sistemas alimentares está a desaparecer, colocando o futuro da nossa alimentação, meios de subsistência, saúde e ambiente sob grave ameaça. “Menos Biodiversidade significa que as plantas e animais são mais vulneráveis a pragas e doenças” – diz a FAO, Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura.
Cada vez é mais evidente que são os sistemas alimentares agroecológicos que contribuem para que esses objetivos sejam atingidos, já que protegem a biodiversidade dos nossos ecossistemas, preservam a biodiversidade das culturas e promovem o sequestro de carbono.
E são precisamente os pequenos produtores os guardiões dessa biodiversidade e da qualidade alimentar e ambiental. Assim, é de todo desejável que o financiamento aos agricultores privilegie aqueles que trabalham solos mais saudáveis, que as ajudas económicas respeitem o princípio da condicionalidade, de acordo com o modo de cultivo, com o respeito pelas condições ambientais.
Cientistas europeus, numa recente carta à Comissão Europeia, instaram a Comissão a melhorar drasticamente a fim de não danificar ainda mais o meio ambiente. Os cientistas afirmam que é precisamente a nova PAC que deve começar a procurar soluções para a crise ambiental
Em “Agricultura biológica – uma boa opção para Portugal?”, artigo de divulgação técnica e de opinião publicado na revista “Frutas Legumes e Flores” de Março 2021, está escrito:
“O aumento da área agrícola de agricultura biológica na UE para 25% até 2030,que parece ser o objetivo mais polémico em Portugal, não coloca em causa a sustentabilidade da agricultura nacional, europeia ou mundial. A FAO, já em 2007, organizou em Roma uma Conferência internacional sobre agricultura biológica e segurança alimentar, e concluiu o seguinte:
1) A agricultura biológica pode alimentar todo o planeta e sem impacto negativo no ambiente;
2) A agricultura biológica pode limitar consideravelmente o problema do aquecimento global e das alterações climáticas.
Esta foi também a conclusão de um trabalho de investigação realizado na Universidade de Michigan, baseado em 293 casos em todo o mundo, comparando a agricultura biológica com outros modos de produção agroalimentar (Badgley C. et al., 2007). Mais tarde, um outro estudo científico, desta vez da Universidade da Califórnia, comparou a produtividade convencional e biológica em 115 estudos publicados que abrangem 1071 comparação da produção biológica e convencional em 52 culturas e 38 países. Aí se conclui que a diferença média de produtividade é de 19% a menos para a produção biológica mas que, quando eram seguidas as melhores práticas agrícolas como a rotação e a biodiversidade de culturas em vez da monocultura, essa diferença baixou para 8 a 9% (Ponisio l. et al 2015).
Além disso, a maior parte dos estudos comparativos publicados encontra melhor qualidade nos alimentos de agricultura biológica, nomeadamente quanto ao maior teor de antioxidantes e ao menor teor de metais pesados e de resíduos de pesticidas (Ba-ransky M. et al 2014).
Um outro aspecto da questão é que a produção agrícola é diretamente proporcional ao uso do recurso água. A intensificação da produção significa intensificação do consumo de água, independentemente da optimização dos métodos utilizados para a rega, tornando a extração por unidade de área e de tempo hostil e incompatível com a capacidade de regeneração natural das reservas hídricas dos ecossistemas. Acresce à pressão antrópica a das alterações climáticas que fazem de todo o designado sul da Europa uma região pré-desértica pelo que qualquer medida que não equacione as directrizes da UE para a adaptação às alterações climáticas, incluindo o estímulo ao desenvolvimento da agricultura biológica, agricultura tradicional de sequeiro ou outros modos sustentáveis, um acto de agressão desacelerador do cumprimentos da metas ambientais definidas pela própria EU e ameaçador da sobrevivência das espécies, incluindo a humana.
3. A elevada percentagem da agro indústria face à agricultura familiar e à biológica
A agricultura biológica usa práticas amigas da biodiversidade, porém, segundo dados estatísticos da FAO, Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura, esta agricultura representa pouco mais do que 1% da superfície agrícola global.
Em Portugal a agricultura biológica ocupa apenas 3.970ha (1,35% da área total em AB) de legumes (hortícolas não industriais) e morangos; 4.323ha (1,47% da área total em AB) de frutos frescos, incluindo também os pequenos frutos arbustivos e os citrinos; 4.513ha (1,54% da área total em AB) de cereais para grão; 1.016ha (0,34% da área total em AB) de leguminosas secas.
4. As dificuldades no acesso aos apoios
Em Portugal esta situação gera desigualdades no escoamento dos produtos pelo efeito que provoca nos preços, tornando mais elevados os da produção biológica face aos dos produtos da agricultura intensiva.
A actual PAC tem falhado no apoio à agricultura sustentável, porque têm sido os agricultores que tem maior área cultivada os que são mais apoiados. A próxima reforma da PAC será mais importante do que nunca para os Estados-Membros. A Comissão determinou os objectivos e as metas de base, mas cada país terá liberdade de adaptar a política ao contexto nacional.
É preciso tomar medidas a nível nacional para mudar para uma política alimentar e agrícola mais sustentável e mais ecológica
5. Portugal quase só colhe os impactos negativos da agroindústria
Os efeitos negativos da agroindústria no solo, na água e na qualidade do ar ficam para todos os portugueses, incluindo as gerações futuras; os lucros vão apenas para alguns, nomeadamente empresas estrangeiras.
6. Os benefícios da pequena agricultura biológica, das cadeias curtas e dos sistemas alimentares locais
Se a nova PAC for efetivamente de encontro ao Pacto Ecológico Europeu (PEE) nomeadamente à estratégia do “Do Prado ao Prato”, que quer reduzir a utilização de pesticidas em 50% e reforçar a área de agricultura biológica em 25% até 2030, será dada prioridade ao apoio às pequenas e médias explorações agrícolas, à agricultura biológica e à promoção a práticas benéficas para o ambiente, com a implementação de instrumentos como os regimes ecológicos obrigatórios
Exigimos:
1. Um Quadro de Incentivos Equitativos para a agricultura não intensiva
A transição ecológica da agricultura deve ser feita pela PAC, colocando imediatamente fim às ajudas baseadas no volume da produção e aos pagamentos diretos baseados unicamente na propriedade da terra.
Deve igualmente colocar fim aos pagamentos cegos por hectare de propriedade, substituindo-os por financiamentos e ajudas direcionadas para promover uma transição para a agroecologia.
2. Que seja criado de imediato o estatuto da agroecologia
A Agricultura Familiar e a Agricultura Biológica têm que ser incentivadas de modo a poderem recuperar da situação de desvantagem em que têm estado. No entanto, a agricultura integrada não deve ser considerada com a mesma subsidiariedade que a agricultura biológica na medida que usa fitofármacos e outras práticas lesivas do ambiente.
Como medidas a serem tomadas no presente próximo queremos:
- Que se combata a perda da agricultura comunitária de pequena escala oferecendo condições de trabalho decentes aos agricultores e trabalhadores rurais.
- O fim dos pagamentos cegos por hectare de propriedade, substituindo-os por financiamentos e ajudas direcionadas para promover uma transição para a agroecologia.
- A proteção da água, reduzindo as dependências energéticas e químicas, e promovendo o bem-estar animal através de financiamentos específicos.
- A priorização da produção sazonal, local e justa de frutas, vegetais, grãos, laticínios e carnes, garantindo o acesso a uma alimentação saudável, nutritiva e acessível para todos.
Cidadãos pelo CEA Tavira