Artigo de opinião da Vice-Presidente da JSD Algarve, Mariana Marques.
A democracia em Portugal e no mundo enfrentam uma série de desafios que questionam os seus princípios fundamentais. É, por isso, imprescindível empreender uma análise e uma reflexão crítica sobre estes desafios visando compreender tanto as
ameaças quanto as potenciais oportunidades que se delineiam.
Em Portugal, a democracia assume uma posição central no sistema político, não só como modelo governativo, mas também, como valor na construção e salvaguarda da identidade nacional.
A etimologia da palavra “democracia” encontra as suas raízes na tradição grega resultando na fusão das palavras em latim “demos” (que significa “povo”) e “kratos” (que significa “poder”), indicando um sistema de governo no qual o poder é exercido pelo povo.
A democracia é um sistema político caracterizado pela participação dos cidadãos nas tomadas de decisões e pelo respeito pelos direitos humanos e liberdades individuais. As suas origens, em Portugal, remontam à História, mais especificamente, à Revolução dos Cravos, em 1974.
Este ano, assinalou-se o quadragésimo nono (49º) aniversário das comemorações do dia 25 de Abril, mas nem sempre o povo português viveu em democracia.
Portugal já viveu sob monarquias, mas com a Revolução Liberal de 1820 e a Constituição de 1822 denotou-se alguns passos rumo à democracia. Mais tarde, a implementação da Primeira República, em 1910, trouxe um breve período de experiência democrática, mas que finalizou com o golpe militar de 1926, instaurando-se uma Ditadura Militar até 1974.
O marco histórico na História do nosso país e na História da democracia portuguesa ocorreu com a Revolução dos Cravos no dia 25 de Abril de 1974, quando as Forças Armadas lideraram um golpe militar que derrubou o regime autoritário do Estado Novo
de Salazar. Este dia permitiu abrir caminho para um período de transição para a democracia, marcado pela elaboração de uma nova Constituição de 1976 (que estabeleceu os princípios fundamentais da República Portuguesa e incluiu a separação de poderes e a proteção de direitos fundamentais) e pela realização de eleições democráticas (com periodicidade definida).
A adesão de Portugal à Comunidade Económica Europeia (atualmente designada por União Europeia), em 1986, teve um impacto positivo na consolidação da democracia, incentivando reformas e alinhando o nosso país com os padrões democráticos europeus.
Desde 1974 até à atualidade, a democracia consolidou-se como identidade e valores nacionais, valores estes que sustentam o sistema de governo e incluem a Soberania Popular (em que a autoridade do governo emana do povo), Estado de Direito (baseado
na primazia da lei que é aplicada a todos), Separação de Poderes (Executivo, Legislativo e Judicial), Pluralismo Político (permitindo-se a existência de múltiplos partidos políticos), Direitos Fundamentais (garantia de direitos e liberdades individuais), Eleições Livres e Justas (realizadas periodicamente de forma transparente e justa), Participação Cívica (os cidadãos têm o direito e a responsabilidade de participar ativamente na vida política).
Pode-se identificar três tipos de democracia: Democracia Direta, Democracia Representativa e Democracia Semidireta. Em Portugal, foi estabelecido o sistema parlamentar da Democracia Representativa (onde os cidadãos elegem representantes que tomam decisões, criam políticas e aprovam leis, formando, desta forma, o governo) no qual constam elementos da democracia semidirecta permitindo aos cidadãos influenciar decisões políticas importantes.
Desde 1974 que Portugal tem um regime democrático, contudo, isso não impede que o sistema enfrente desafios significativos.
É conhecido, principalmente pelos meios de comunicação social, o aumento de casos de corrupção dos decisores políticos, o que levanta preocupações em relação à ética política.
Além disso, observa-se uma crescente polarização política que alimenta a fragmentação entre os partidos políticos e torna complexo o consenso entre partidos.
Nos últimos tempos, tem-se verificado o aumento de movimentos políticos extremistas e populistas que representam uma ameaça para os valores democráticos.
Passaram-se dois anos desde as últimas eleições legislativas, período em que Portugal registou uma taxa de abstenção de cerca de 42% (PORDATA), o que significa que os eleitores e cidadãos sentem-se cada vez menos representados pelos partidos políticos, levando a questionar o sistema de democracia representativa.
O surgimento dos novos partidos extremistas ocorre predominantemente como resultado do descontentamento relativo aos partidos políticos existentes. Estes partidos, cujas propostas são frequentemente populistas, cativam um elevado número de
eleitores que, muitas vezes, não percebem o perigo que a ascensão destes partidos políticos extremistas podem representar para o sistema democrático do nosso país.
Nos passados dias 14, 15, 16 e 17 de Setembro, tive a honra de poder participar na primeira edição do Bootcamp da Democracia, organizado pela Agência Nacional de Erasmus+ Educação e Formação e pela Comissão Comemorativa dos 50 anos do 25 de
Abril, em Marvão. Ao lado de 29 participantes, demonstrou-se a preocupação dos jovens relativa aos atuais desafios da democracia portuguesa, bem como da participação cívica.
A participação cívica e democrática dos cidadãos, principalmente dos mais jovens, motiva-se pelos resultados insatisfatórios das políticas públicas que mantêm presentes as desigualdades económicas e sociais no quotidiano. A situação atual do
nosso Sistema Nacional de Saúde (SNS), refletida nos longos tempos de espera em hospitais, bem como a condição da Educação, marcada pela escassez de docentes, na falta de planeamento de políticas de habitação para docentes e estudantes e pelas
dificuldades no acesso ao ensino superior, levantam preocupações em relação ao acesso aos Direitos da Constituição Portuguesa pondo em causa o acesso a estes mesmos direitos como o Direito à Saúde (Artº 64) e o Direito à Educação (Artº 74).
A educação desempenha um papel fulcral na mitigação dos desafios enfrentados pela democracia ao dotar as crianças e os jovens de conhecimento, promover o pensamento crítico e incentivar a participação cívica e o compromisso democrático.
Ainda assim, é crucial uma reforma política no nosso país para tornar o sistema eleitoral mais representativo dos cidadãos perspetivando soluções como um sistema de representação proporcional aberto, na medida em que os eleitores votam em
candidatos individuais e os partidos ganham assentos com base na percentagem de votos que obtêm.
Com o decorrer do tempo, é notório que a democracia se depara com desafios crescentes.
Importa, então, refletir:
Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades, ou mudam-se as características da democracia representativa patentes no nosso país?
JSD Algarve