Os vehinhos

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velhote
Os velhos, os velhinhos, os velhários…

velhoteMas… dantes não havia velhos? Fala-se agora tanto em velhos que até parece que antigamente toda a minha gente morria nova.

Os leitores irão dizer (de novo) que sou uma malvada sem coração mas vede se é demasiado o meu exagero:
Nos meus tempos de moça eram velhas as mulheres com mais de vinte e cinco anos (apelidadas de tias se solteiras) e os homens com mais de trinta e cinco (apelidados de perigosos solteirões).

Concentrar-me-ei sobre o caso das «velhas» posto que os cavalheiros continuam a morrer mais novos (que Deus os conserve!).

Pois bem, as mulheres velhas, as que ficavam para tias, serviam de pau para toda a obra dentro das famílias onde:
1)    Se fossem ricas, serviam para dar ordens às criadas, criticar as noivas e fazer negra a vida dos sobrinhos, das irmãs, dos cunhados etc. Eram uma espécie de pulgas raivosas no seio das famílias, posto que se ser mulher já era mau, ser tia era o cúmulo;

2)     Se fossem pobres, serviam de criadas do pessoal todo, incluindo dos manos solteirões, cozinhavam, esfregavam, passavam a ferro e caluda se queriam cama e mesa, que a roupa lavavam elas e era da família toda;

3)    Quando chegavam aos quarenta ou cinquenta anos eram promovidas a anciãs, embora as tarefas se mantivessem, em ambas as classes;

4)    A partir dos sessenta/setenta eram uma espécie de coisa a quem se chamava «a velha» e, enquanto os ossos deixavam, a faina era a mesma;

5)    Quando se iam abaixo, acamavam. Os leitores/as imaginem o que seria sem as toalhitas nem fraldas absorventes, nem resguardos de plástico em colchões de palha, sem papel higiénico, nem máquinas de lavar roupa.

Nota: Novos Contos da Montanha de Miguel Torga, tem uma personagem que é o «Alma Grande» que era chamado nas aldeias pobres do interior para tratar das situações desesperadas a que se refere o no. 5.

(Em «As intermitências da Morte», José Saramago mostra-nos com mestria o drama da velhice. Vale a pena ler.)
Em minha opinião deveria começar-se a desdramatizar não só a situação do velho moderno, como medir bem o peso dos adjectivos que se lhes atribuem e às suas vidas. Eles são solitários, eles são tristes, eles são pobres, eles são negligenciados e as famílias que não lhes ligam nenhuma e coitadinhos e etc. Serão todos assim?
Um velho a sério é aquele que já não se pode mesmo mexer. Está acamado ou porque já é muito velho ou porque está muito doente. A esta pessoa velha que não se pode lavar, ir às compras, confeccionar os seus alimentos aceito que tenha um estatuto especial e seja merecedor, de parte da sociedade – com a sua família em primeiro lugar – de respeito redobrado, atenção, cuidados a nível de segurança social etc.. tanto como o são as crianças. Agora virem dizer-me aí nas tardes televisivas que os velhos…. e às tantas dou comigo a ver  pessoas completamente válidas, algumas com pouco mais de sessenta anos e outras menos que isso,  a encarreirar-se nas fileiras dos «velhos»?! A choramingar porque estão sós?

Há que moralizar e sem entrar nos lugares comuns de os «velhos são os trapos» é preciso traçar uma linha entre a pessoa capaz e a pessoa com incapacidade e não entre o velho e o novo.

Falam da solidão dos velhos e quem é que fala da solidão dos jovens sem perspectivas, da solidão de um bebé deixado numa creche das sete às sete, às vezes mais… Da solidão de uma mãe solteira? Da solidão de um doente crónico, de um desempregado, de um drogado, de um sem abrigo, de uma prostituta?
Este assunto dava para muitas crónicas mas eu só escrevo uma por semana.

Direi para terminar (e falo para os velhos que ainda são auto-suficientes e não de situações dramáticas) que só está só quem não se tiver a si mesmo, quem nunca se deu bem com a sua pessoa antes de mais e todos.
Falo por mim, quando me perguntam se não me sinto só e eu respondo: «Eu não estou só, estou comigo!»

Jl

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