Na quinta, cheguei ao meu destino, menos costeiro do que o habitual. Se o saxofone tocava bossa nova a atirar para o jazz, ou jazz a atirar para o pop e para a bossa nova, não sei bem, porque na realidade não estava a prestar muita atenção. Tinha sede das vozes da “moçanhada”, que em algarvio correto somos nós, em número quatro. Sede de vinho e de risos ao tombar de uma tarde perfeita porque a companhia era boa.
O gás subia levemente pelos copos transpirados de frescura. O sol forte de verão a ruborizar as caras bronzeadas, meia hora antes de se esconder marotamente, o magano, atrás de um pequeno edifício de dois andares ali ao fundo, tão perto.
Os nossos copos deixavam argolas de água imperfeitas num guardanapo preto, que dizia para bebermos com moderação, em espanhol. Às vezes não é preciso sair do país para se ler outra língua num guardanapo. Às vezes não se lê o que diz o guardanapo. Nós lemos. E rimos de tudo o que há para rir, sem moderação.
A única morte que tolero e simpatizo é a morte pelo riso, porque as pessoas que dizem que morrem de rir parecem mais divertidas do que mortas. Alinho nessa sem pensar duas vezes e brindo à nossa, rindo para dentro, pensando em algarvio perfeito.
Neste Algarve tão luminosamente nosso, seja à beira mar ou à beira-serra, procuramos os eventos como desculpa para celebrar a vida e a nossa presença em comum, nunca o contrário. Reparei nisso há algum tempo. O evento é a desculpa, mas não o motivo. O algarvio é alegre como o corridinho.
O tempo anda propício à nossa “maltesaria”, ou vadiagem. Chama por nós a plenos pulmões e é difícil estar em todos os lugares ao mesmo tempo. Borbulhem as bebidas nas nossas taças no marulhar de gente. Temos muitos motivos para nos juntarmos e arranjar desculpas está cada vez mais fácil. Celebremos por estar onde quer que seja e matemo-nos de riso aos poucos, sempre que nos juntemos. Em Olhão é que não podemos morrer de riso. Temos de nos escangalhar mesmo, porque é tradição. A moçanhada na maltesaria é mesmo assim.
Selma Nunes