A Ria Formosa é habitada há séculos – não são décadas, desculpe-me o Doutor, mas está surpreendentemente errado. São núcleos históricos, sim. Aí está o Senhor Doutor, no púlpito nacional, a atirar larachas aos partidos a que se opõe, utilizando comunidades inteiras como pedras de arremesso. Atrevo-me a dizer que roça o calculista e o irresponsável. E é feio. Feião. Não que isso o preocupe, talvez, mas é.
Esta questão da Ria Formosa envolve pessoas de carne e osso: pescadores, mariscadores, no geral, o conhecido “zé-povinho”. É provável que tenha sido um deles a apanhar as suas amêijoas, quando vem veranear para estas bandas. Ou ostras. Ou peixe. Eles pagam impostos de algo que não é reconhecido legalmente como seu, coisa que parece desconhecer (IMI, taxas e impostos municipais vários, assim como despesas do dia a dia). Não são boas pedras de arremesso e pergunto-me, deveras, quem será o “clandestino”, tendo em conta que me entra em casa sem convite, também pela televisão. Defendo-me com o comando, que terá sempre pilhas para a ocasião.
Isto para lhe dizer que prefiro quando escreve ficção. Parece-me mais fidedigno nos seus romances. Juro.
Esta “questão” que foi à Assembleia e o despenteou, ao ponto de merecer um “ocorrimento” da sua parte, causou-me estupefacção. Não esperava tanta desinformação. Pronto, já disse! É a minha opinião.
Se acusassem o meu autor de ficção português contemporâneo preferido de não pagar os seus impostos, provavelmente seriam processados por difamação e calúnia. Está com sorte, pois os ilhéus gastam o dinheiro em impostos e em advogados que batalhem pela legitimidade que obviamente têm e não em processos por difamação. Essa foi um bocadinho mal atirada, Doutor.
Como pobre que sou, não posso usar um “boomerang” contra si, perguntando qual é a maior probabilidade de fuga aos impostos: uma comunidade de pescadores ou o círculo no qual se insere? Mas não posso, nem devo. Assumindo a mirabolante ideia de que leria esta crónica, que tenho a certeza que não, fui educada a presumir inocência quando não tenho conhecimento de causa. Devia experimentar. Conselho de leitora assídua, sem IVA. E depois porque não posso pagar danos morais. Só cafés, mas a quem quero.
Ser sua leitora, é um crime que deixarei de cometer. Era daquelas pessoas que lêem mesmo os seus livros. Lia-os, por hábito, veja lá, no barco da carreira, a caminho das comunidades da Ria Formosa. Por melhor e mais rica que seja a construção das personagens (e são-no!) venho a descobrir que a sua foto na contracapa não é merecedora da viagem que tem feito. Lamento. Erro meu.
Vou começar a passear outros autores em seu detrimento. Não que isso o aflija, óbvio, são só menos uns vinte euritos por cada obra. Coisa pouca para si, provavelmente, um investimento para mim. Desde já os meus pedidos de desculpa aos amigos ilhéus por transportar comigo livros daquele que tanto mal lhes quer, sem os conhecer. Ocorreu-me…
Selma Nunes