O consumo excessivo de gorduras, de adição de açúcares, de sal nos temperos e a ingestão frequente de produtos ultraprocessados estão entre os “pecados” alimentares mais comuns e devem ser corrigidos, uma vez que “são muito prejudiciais para a saúde”, alerta a médica Selma Souto, especialista em endocrinologia do Centro Hospitalar Universitário de São João, no Porto.
Outro hábito pouco saudável apontado pela médica, nas vésperas de mais um Dia Mundial da Alimentação, que se assinala a 16 de outubro, “é a ingestão abundante de álcool e bebidas açucaradas que muito contribuem para o aumento da ingestão calórica”. Selma Souto sublinha que a alimentação pouco variada, por exemplo, com baixo consumo de frutas e produtos hortícolas, é frequente em pessoas com obesidade, e pode contribuir para a carência de algumas vitaminas e minerais, essenciais para garantir saúde e bem-estar. E lembra que a obesidade também implica um risco acrescido para o desencadear de outras doenças como a diabetes, doenças cardiovasculares, musculoesqueléticas, respiratórias e alguns tipos de cancro.
Não culpe apenas a genética
Existem vários fatores que podem contribuir para sucessivos balanços energéticos positivos e para o consequente aumento do peso. Selma Souto dá como exemplo o aumento da ingestão de calorias, o sedentarismo, os disruptores endócrinos, alguns medicamentos, a cessação tabágica e fatores psicossociais. Ou seja, apesar de a hereditariedade ter algum “peso” na nossa balança, a verdade é que há muita margem para a pessoa intervir, a começar pelas escolhas alimentares, mas não só: fazer uma alimentação mais variada e equilibrada, mais atividade física, menos stress e melhoria da qualidade do sono.
Equilíbrio metabólico é fundamental
A obesidade é uma doença endócrina e multifatorial, sendo a microbiota (flora) intestinal um dos vários fatores que pode contribuir para o nosso equilíbrio metabólico. Daí que seja tão importante ter uma alimentação cuidada e hábitos de vida saudável. A microbiota intestinal é fundamental na monitorização e controlo do equilíbrio metabólico e dos gastos energéticos. Há bactérias que podem ajudar a regular o apetite, a saciedade e o armazenamento de energia. Por isso, garantir o equilíbrio e diversidade da comunidade de microrganismos presentes no intestino é uma das formas de prevenir não só problemas de excesso de peso, como outras doenças.
Selma Souto explica que o desenvolvimento da obesidade pode ser influenciado pelas proporções relativas dos dois tipos de bactérias da flora intestinal, designadamente, Firmicutes e Bacteroidetes. “A evidência científica sugere que a atividade metabólica destas bactérias intestinais tem influência nas calorias ingeridas e pode modificar a regulação e o armazenamento de energia obtida a partir dos nutrientes e o armazenamento de massa gorda”, revela. Sabe-se, por exemplo, através de estudos realizados, que a microbiota de indivíduos com obesidade tem maior quantidade de Firmicutes e menos Bacterioidetes. O oposto acontece quando há perda de peso.
Como intervir na obesidade?
De acordo com a médica, a intervenção na pessoa com obesidade deve começar pela história clínica e um exame físico detalhado. Na história clínica, “é fundamental a avaliação da evolução ponderal desde o nascimento até à atualidade, identificação de possíveis causas para o aumento de peso, tentativas prévias de perda de peso e seus resultados, avaliação da ingestão alimentar e da atividade física, expectativas da pessoa e grau de motivação para a mudança, doenças/comorbilidades associadas e a sua história familiar”. Quanto ao exame físico, devem ser avaliados “os parâmetros antropométricos, a presença de sinais sugestivos de doença endócrina ‘clássica’ e de comorbilidades associadas”.
Selma Souto explica que a história clínica e exame físico são fundamentais porque “em cerca de 4% dos casos, a obesidade tem como causa uma doença endócrina ‘clássica’ e, em cerca de 1%, uma causa genética que precisa de ser identificada”. E acrescenta que é por esta razão que devem ser pedidos exames analíticos para avaliação das causas e/ou comorbilidades da obesidade.
“A primeira linha do tratamento é o plano alimentar e a atividade física, sendo que atualmente temos várias opções de tratamento médico, com evidência significativa na perda de peso, desde os probióticos à terapêutica farmacológica oral e injetável, e nos casos de obesidade mais grave a cirurgia bariátrica”, esclarece a especialista em endocrinologia.
Em relação ao plano alimentar há recomendações que podem ser importantes para perder peso, alterar hábitos pouco saudáveis e alcançar mais saúde e bem-estar e que devem ser acompanhadas por um médico:
1 – Evite os alimentos processados. Este tipo de alimentos tem valores calóricos mais elevados, intensificadores de sabor, adoçantes artificiais, entre outros. Opte por alimentos mais próximos do seu estado natural e cozinhe-os com gorduras de boa qualidade (azeite, por exemplo) e reduza o sal, compensando com ervas aromáticas e especiarias. Os aditivos como emulsionantes ou adoçantes podem alterar a microbiota intestinal e ter um impacto metabólico não desejável, como inflamação crónica de baixo grau e resistência à insulina. O sal está associado ao aumento da tensão arterial, ao risco de AVC e à obesidade.
2 – Consuma mais alimentos ricos em fibra: hortícolas, fruta e leguminosas. Estes alimentos apresentam, em geral, um baixo valor calórico, conferem saciedade, vitaminas e sais minerais. A fibra, que é um prebiótico, que contribui para alimentar os probióticos presentes na nossa microbiota. Muitos destes alimentos de origem vegetal ajudam na regulação do metabolismo e facilitam a degradação de gordura.
3 – Lanches saudáveis para não cair em tentação. Quando a fome aperta, dentro ou fora de casa, a tentação é, muitas vezes, escolher uma solução mais prática e cómoda, mas convém que seja saudável. Por isso, prepare os seus lanches. Tenha à mão fruta, iogurtes com pouco teor de gordura, cereais ou pão integral para fazer uma sandes saudável (queijo magro, alface, ovo, por exemplo). Frutos secos sem sal, como as nozes ou o caju, em pequenas quantidades, são também uma boa opção. Bolachas, chocolates e bolos estão quase sempre cheios de açúcar.
4 – Não “salte” refeições. É preferível fazer 5 a 6 refeições diárias (mas atenção às quantidades!) do que ficar muitas horas sem comer. A fome fará com que se sinta mais tentada a fazer escolhas que não são tão saudáveis, além de que, muito provavelmente, vai acabar por comer mais. Além disso, os intervalos regulares ajudam a manter os níveis de energia. Nas refeições principais, comece com um prato de sopa para aumentar a sensação de saciedade.
5 – Beba água. A água é fundamental para o funcionamento do organismo. Não é por acaso que está no centro da roda dos alimentos. Na verdade, está representada em todos. A ingestão de água é essencial para que todo o metabolismo funcione. Evite os refrigerantes e as bebidas alcoólicas.
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TR